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Espaço & Movimentos Reivindicatórios: o caso de Nova Iguaçu

Espaço e movimentos reivindicatórios Nova iguaçu

2ª Edição

Este trabalho constitui um esforço de melhor compreensão do significado do espaço nas lutas sociais que se travam voltadas, diretamente ou não, conscientemente ou não, para a transformação da sociedade. Para tanto recorremos aos movimentos reivindicatórios que têm com base social os setores proletários urbanos e que se desenvolvem na esfera do consumo que, embora não constituindo fenômenos recentes, vem adquirindo importância crescente no cenário nacional, seja par sua generalização e continuidade, seja pelos seus efeitos a nível urbano e político.

Tais movimentos surgem fora das unidades de produção, centrados num amplo conjunto de problemas relacionados com as condições de reprodução desses setores populares, reivindicando equipamentos de consumo coletivo e serviços sociais básicos. Estes problemas vão apresentar certa especificidade em países como o Brasil, onde o processo de periferização se agudiza, reproduzindo-se a massa trabalhadora – empregada ou não – quase sempre em condições de pobreza absoluta, a custos muito baixos.

Assim, há uma estreita correspondência entre a base social protagonista desses movimentos que se caracteriza por níveis de vida muito precários e apresenta grande diversidade em termos de inserção plena ou não no processo de produção capitalista e as reivindicações levantadas.

A extrema desigualdade na distribuição dos recursos da sociedade se manifesta através de fortíssima segregação espacial. Em outras palavras, a renda insuficiente também provoca uma concentração social, resultado da segregação urbana e, prova disto, é a existência e a forma de expansão daqueles espaços chamados periféricos ao redor das grandes metrópoles que se caracterizam pela ausência ou insuficiência de emprego, serviços, equipamentos básicos, etc., bem como pelas grandes distancias em relação às áreas concentradoras destes.

Trata-se daqueles espaços que por assim se apresentarem são mais desvalorizados, tornando-se de certa forma mais acessíveis a reprodução de amplas camadas do proletariado urbano e, consequentemente, mais favoráveis a produção de bases organizativas de resistência na esfera da reprodução.

0 espaço pode ser compreendido, portanto, com uma realidade contraditória, como um conjunto de relações sociais contraditórias e conflitivas mais ou menos cristalizadas. É na manifestação social e política concreta dessas contradições que são gerados os conflitos que, por sua vez, podem se constituir em caminhos de transformação.

Não queremos dizer com as afirmações a cima que a organização do espaço implique, automaticamente, no surgimento de movimentos reivindicatórios urbanos. A problemática muitas vezes está presente no espaço, seu desenho lá se encontra, mas este fato não é suficiente, pois, desenho espacial, vida urbana e vivência do político são coisas diferentes.  O fundamental é, portanto, identificar as articulações espaciais (sociais e políticas) que possibilitam o surgimento dos movimentos reivindicatórios, cabendo perguntar que elementos intrínsecos se desenvolveram neste espaço ou foram para ele trazidos, deflagrando a mobilização.

Nessa perspectiva desenvolveremos nosso estudo, centrando as investigações nessa fração da periferia da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, Nova Iguaçu, que nos vai fornecer o quadro territorial de observação e análise.  Aí surgiram estruturas  organizativas decorrentes de necessidades que, a partir de certo momento se tornaram insuportáveis para expressivas parcelas de moradores, como a falta de água, luz, esgoto, transporte, escola, saúde, etc. Aí também se desenvolveram organizações mais estruturadas como o Movimento Amigos de Bairro de Nova Iguaçu (MAB), que podem vir a constituir expressões de resistência dos trabalhadores, na qualidade de consumidores, contra a expropriação geral do sistema.

Tem sido atribuída, principalmente ao Estado, a tarefa de investir na produção desses equipamentos e serviços de baixa rentabilidade, já que a renda social destinada a ser transformada em investimentos e colocada sob sua tutela. Porém, o Estado tem se alimentado da mais valia social, sem atender às necessidades mais urgentes das populações carentes, surgindo como o antagonista e constituindo-se no grande interlocutor dos movimentos reivindicatórios de bairro, como o MAB.

Convém ressaltar que o estudo do MAB se impõe na medida em que, praticamente, não existem dois movimentos ou duas organizações iguais ou com a mesma história, sendo, portanto, o MAB, marcado desde o seu nascimento pelas condições concretas do espaço Nova Iguaçu, que se situa no contexto mais amplo da nossa formação econômico-social.

Daí a necessidade de se estudar as características desse espaço de reprodução de amplas camadas do proletariado urbano, a especificidade com que os problemas aí se apresentam, as características e as reações da base social envolvida, bem como o comportamento do poder público, destinatário de suas reivindicações.

Cabe, desenvolver, ainda, uma análise mais profunda dessas mobilizações que podem ter ou vir a ter efeitos apenas imediatos a nível urbano, quando vinculadas a objetivos exclusivamente      de âmbito local.

Os efeitos do ponto de vista político dependem      de mudanças concretas dessa base social proletária, transformada, pela mobilização, em força social e de práticas que aprofundem o conjunto mais amplo de contradições sociais e, portanto, apontem para mudanças estruturais e não simplesmente conjunturais. O alcance dos movimentos de bairro no que se refere a transformações mais amplas relaciona-se, pois, aos conteúdos e formas organizativas que imprimam um caráter de classe ao movimento, já que a pauperização em última instância tem sua origem nas relações de classe.

Nesta breve exposição já se foi delineando a postura teórica a ser adotada, ou seja, a forma de conhecer e interrogar as relações existentes entre as condições de organização do espaço-moradia do proletariado urbano e a explicitação do conflito num determinado lugar e momento.

Trabalhamos, portanto, com certos conceitos estratégicos e com certas categorias que compõem o suporte teórico da abordagem histórico-estrutural como capital e trabalho, classes sociais, forjadas no real e que a ele voltam como instrumentos para objetos de investigação, processando-se um retorno contínuo entre o real e o teórico.

Tenta-se, assim, conseguir maior aproximação de uma real compreensão das condições de reprodução de camadas da massa trabalhadora urbana, bem como das respostas emitidas par estas em função daquelas condições.

Procurar entender esse processo em formações sociais como a nossa, constitui tarefa fundamental para a Geografia e ao mesmo tempo de grande complexidade, considerando-se que até agora a produção geográfica pouco contribuiu para que seja percebido até que ponto esses movimentos reivindicatórios atingem a estrutura da sociedade e em que medida a análise do espaço contribui para essa compreensão. Por outro lado, deve-se, ainda, ressaltar que a própria politização da Geografia como um todo está longe de ter sido alcançada, havendo necessidade de todo um esforço coletivo nessa direção.

Em face desses limites nos propomos a dar nossa contribuição iniciando o debate, numa tentativa de abrir caminho para posterior desenvolvimento do tema em questão, utilizando as contribuições de outras disciplinas.

A exposição do enfoque teórico e objeto do primeiro capítulo onde foram estabelecidos alguns marcos a respeito da questão do espaço, dos movimentos reivindicatórios e levantadas questões relevantes, colocadas por autores abalizados.

No capítulo II procura-se, através da história, analisar  a produção do espaço urbano de Nova Iguaçu no processo de formação e desenvolvimento da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, no emaranhado das relações de classe que preside tal processo. Aí estão contidas e explicitadas de forma diferencial  e histórica as contradições responsáveis pela eclosão do conflito.

Enquanto o capítulo II nos deu o quadro básico de gestação das condições para a mobilização popular em Nova Iguaçu, o capítulo III apresenta um panorama geral das bases do conflito, ou seja, dos contornos da base territorial e social, bem como das diferenciações que se estabelecem nesta última. Efetuamos, assim, um mergulho no real, num primeiro momento através da pesquisa  de arquivo no jornal “correio da Lavoura” e nos próprios arquivos do MAB, material complementado e aprofundado com entrevistas concedidas por lideranças que desempenharam papel importante no movimento, possibilitando identificar certos meandros da questão. Num segundo momento procedeu-se à pesquisa de campo, a fim de melhor perceber as diferenciações da base social, aplicando-se questionários-entrevista num dos bairros origem do movimento.

Todo esse material contribuiu para melhor apreensão desse espaço, num determinado momento, no que se refere à manifestação das contradições aí presentes, à sua lógica interna e, ao mesmo tempo, favoreceu na compreensão de como a totalidade social se traduz nessa porção do espaço através das características que lhe são peculiares.

No capítulo IV procuramos detectar as articulações que se produziram nesse espaço-consumo, favorecendo o “pôr-se em movimento”. A seguir buscamos analisar o crescimento do MAB, a espacialização do fenômeno e o caráter e perspectivas desse movimento, avaliando as práticas desenvolvidas através de entrevistas em profundidade.

Finalmente no capítulo V nos esforçamos para reavaliar algumas questões levantadas, privilegiando os aspectos políticos, as limitações encontradas, a contribuição do trabalho e sua importância no âmbito da produção geográfica.

 

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